Em plena era da globalização, a cada dia nos aproximamos mais de pessoas de outros países e somos desafiados a ultrapassar diferenças e nos adaptarmos a diversas culturas, sem ignorar crenças, convicções e costumes. Tornar-se multicultural não quer dizer abandonar a cultura de origem, mas entender que as boas maneiras em um país pode ser ofensivo em outros.
Lidar com pessoas de outros países significa lidar com hábitos muito
diferentes, o que não é uma tarefa fácil. A compreensão das diversidades
é o desafio maior das negociações internacionais, pois se não forem
detectadas podem causar mal entendidos culturais e destruir
possibilidades de negociação.
O contato comercial entre executivos do Brasil e China tem levado
muitas pessoas a conhecer essa interessante cultura. Ainda que a China
tenha se inserido na economia global com extrema rapidez, os chineses
não abandonaram suas tradições milenares. Os rituais, a etiqueta e o
protocolo continuam a ser fundamentais.
Confundir a cultura chinesa com a cultura japonesa é uma gafe
imperdoável, pois apesar de parecidos são duas culturas que tem muitas
diferenças. A cultura chinesa é berço de uma das civilizações mais
antigas e complexas, cobrindo uma história de mais de 5.000 anos. Com
uma vasta região geográfica, a China mantém hábitos, costumes e
tradições que variam bastante entre províncias. Além das dificuldades
impostas pelo idioma, há de se ter extremo zelo por seus valores. A
maioria dos valores sociais na cultura e hábitos chineses derivam do
Confucionismo e Taoísmo, além do Budismo e Neo-confucionismo.
Extremamente formais e educados, os chineses valorizam muito a
humildade, sinceridade e cortesia. Há uma grande preocupação em
preservar a harmonia do ambiente, evitando qualquer descortesia que
possa constranger os outros. Polidos na forma de tratamento, acima de
tudo buscam manter a dignidade e o respeito pelos outros. Primam pela
simplicidade e elegância, qualidades que visam manter a harmonia
caracterizada pela leveza na forma e movimento.
Uma regra de ouro na China é nunca criticar, desrespeitar, acusar,
insultar ou diminuir as pessoas perante outras. Falar mal dos outros é
considerado um erro lamentável; mais vale mudar de assunto quando não
concordar. Se alguém discorda de outra pessoa nunca deve demonstrá-lo
publicamente.
No entanto, valorizar os outros é algo positivo; dá prestígio
contribuir para o prestígio dos outros. Porém sendo a modéstia e a
humildade virtudes muito apreciadas pelos chineses, eles reagem mal aos
elogios. Deve-se aceitar com humildade os elogios e dizer que não é
merecedor de tal distinção.
Os chineses têm um extraordinário senso de humor. Eles podem rir de
si mesmos mais facilmente se eles tem uma relação confortável com a
outra pessoa. Esteja pronto para rir de si mesmo, dadas as
circunstâncias apropriadas.
Pedir desculpa por um engano não é vergonhoso, ao contrário é
considerado uma virtude ser o primeiro a fazê-lo a fim de amenizar
qualquer situação desagradável. No entanto, não é usual entre os
chineses desmarcar um compromisso assumido. A pontualidade não é
meramente uma questão de etiqueta, é um compromisso; atrasos são
considerados como um desrespeito e grave ofensa.
Os hóspedes chineses sempre aguardam para serem escoltados aos seus
lugares, numa ordem decrescente de classificação, seja numa reunião ou
jantar. Com rígidos rituais, a cultura chinesa trata com deferência quem
tem maior autoridade mas principalmente as pessoas mais idosas. Essas
são as pessoas que merecem a precedência em qualquer ocasião.
Apresenta-se sempre a pessoa mais nova à mais idosa.
Sempre a idade é o critério na hierarquia e ao se dirigir a uma
pessoa mais velha, é sinal de respeito anteceder o sobrenome de Lao, ou
seja, o velho. Os chineses tratam-se pelo sobrenome e nunca pelo nome
próprio ou alcunha. Só se usa tratar pelo nome próprio entre amigos
íntimos e familiares.
O sobrenome vem à frente do nome, pois consideram que o nome de
família é mais importante do que o nome individual. Muitas vezes há um
nome geracional que pode aparecer ligado por um hífen ao nome próprio ou
separadamente, por exemplo: Li-Huang-Fung = Li (sobrenome), Huang
(geracional), Fung (nome próprio). Li é um sobrenome muito comum na
China.
Na China ninguém se apresenta diretamente, espera para ser
apresentado por uma terceira pessoa. Quando se precisa transmitir más
noticia, usa-se um intermediário. Apesar de terem adotado em parte o
costume ocidental de aperto de mãos, este se restringe apenas no momento
das apresentações acompanhado da inclinação da cabeça. O Kowtow é uma
reverência que se faz em demonstração de respeito a quem se cumprimenta.
Não se toca nas pessoas nem mesmo com a intenção de ajudá-las ou na
indicação de um caminho. Faz parte da cultura chinesa manter um certo
distanciamento físico dos outros. Efusivas demonstrações públicas de
afeto ou de alegria, tampinhas nas costas, abraços e beijinhos não são
bem aceitos. Usa-se apenas o aperto de mãos.
É intolerável não portar um cartão de visitas nas apresentações. Se
para um ocidental o cartão de visitas é apenas um papel, para os
chineses é um documento importante. Os cartões são trocados após a
introdução inicial, tendo de um lado os caracteres chineses
simplificados que são impressos em tinta de ouro, que é uma cor
auspiciosa.
Entrega-se o cartão segurando com as duas mãos e virado de modo que
quem recebe possa ler o nome, de preferência escrito em mandarim ou
cantonês, com as devidas qualificações sem abreviaturas. Ao receber um
cartão de visita de um chinês deve-se observá-lo atentamente, pois ele
representa a pessoa.
É educado manter o cartão de visita sobre a mesa em local visível
para futura referência, nunca guardá-lo no bolso e nem escrever no
cartão. É imperdoável esquecer o nome de uma pessoa, como também perder
ou esquecer o cartão ao final de uma reunião, que pode demonstrar
desrespeito e desprestígio à pessoa.
É preciso estar atento aos significados que tem as cores, números e
imagens, pois isso é uma questão séria na China. Logotipo dourado é
apreciado como prestígio, mas cartões em cores devem ser usados com
cautela assim como imagens de animais. Uma cegonha no ocidente está
associada aos nascimentos; no oriente está associada à morte. O morcego é
um símbolo de felicidade.
Para os chineses as cores suscitam emoções e proporcionam o aumento
ou a diminuição de certo tipo de energias, conforme o local e as
circunstâncias em que são utilizadas. Na cultura chinesa:
- A cor branca está associada à morte e ao luto.
- O preto simboliza dinheiro.
- O azul significa esperança.
- O amarelo transmite representa autoridade, a cor associada ao Imperador.
- O vermelho significa prosperidade e sucesso, tanto que as noivas chinesas vestem-se de vermelho no dia do casamento para atrair sucesso e fertilidade na vida conjugal.
Uma grande parte da cultura chinesa é baseada na noção de que o mundo espiritual existe. Vários métodos divinos tem ajudado a responder perguntas e até servido como alternativa à medicina. Folclores e mitologia tem ajudado a preencher o espaço para coisas que não podem ser explicadas. Frequentemente há uma linha tênue entre mitos, religião e fenômenos não explicados.
Muitas das histórias mitológicas e religiosas transformaram-se em feriados tradicionais chineses. Junto à crença no sagrado, há também a crença no mal. Práticas como o exorcismo taoísta é um dos conceitos passados por gerações. Alguns rituais de previsão de sorte ainda são usados hoje em dia, como o hábito dos biscoitos da sorte, depois de centenas de anos de refinamento.
Nunca demonstre descrédito se uma reunião for remarcada devido aos
augúrios do dia ou pelo uso de objetos e outras práticas esotéricas
durante a reunião. Mesmo que não se entenda os conceitos ou tenha
opinião contrária, sempre é educado respeitar as crenças alheias. Os
chineses são muito supersticiosos e seguem rigorosamente algumas
indicações astrológicas e a disposição do Feng Shui. Leia mais em meu
blog "Astrologia Chinesa e Feng Shui". Click aqui
Na China o número 4 é considerado um número azarado, sendo muito
comum prédios sem o 4º andar e a preferência por telefones móveis sem o
número 4. O ideograma que representa a palavra quatro "shi" é igual ao
que representa a palavra morte. Por isso é necessário evitar convidar
chineses para o 4º andar, uma sala e qualquer local que esteja
relacionado ao número 4, como também não marcar encontros envolvendo
apenas 4 pessoas.
O número 5 e seus múltiplos são mais recomendados. como também o
número 8 que é considerado um número de sorte, prosperidade e evoca o
infinito. Essa questão é tão séria que a Olimpíada de Pequim foi marcada
para ter início no dia 8/8/2008 exatamente as 8h08.
Os chineses se sentem muito prestigiados com quem tenta falar seu idioma. Conhecer algumas palavras do idioma pode propiciar situar-se em algumas ocasiões, mas se não houver completo domínio do idioma é preferível contar com o apoio de um intérprete do que arriscar-se a ser mal compreendido.
O Mandarim é uma língua extremamente difícil e muitos chineses falam
outros dialetos como o Cantonês. Cada palavra chinesa pode ter muitos
significados dependendo do tom em que é dita. Por não existir tempos de
verbos, é preciso ter cuidado com as traduções sendo necessário juntar
expressões indicando o tempo: agora, amanhã, ontem etc. Também há formas
de saudação diferentes para um superior ou um inferior hierárquico e
para uma pessoa mais velha ou mais nova.
Os chineses consideram muito importante o que se diz, mas o mais
importante é a forma do que é dito e do que não é dito. O tom de voz
deve ser harmônico, sem exaltações e confrontos. Mesmo que haja um
intérprete, deve-se falar na direção do chefe da delegação e manter o
olhar na direção dele durante a tradução, sem fixá-lo.
Para evitar contradições, nas reuniões há sempre um porta voz e só um
fala em nome de todos. O material escrito de uma reunião deve estar
disponível em inglês e principalmente em mandarim usando caracteres
simplificados, pois isso demonstra o grau de seriedade e de preparo para
desenvolver negócios efetivos.
O objetivo deve ser sempre de consenso e preservação da harmonia em
qualquer circunstância. Isso inclui estar atento à linguagem verbal e
corporal evitando alguns gestos, pois os chineses são muito observadores
quanto à postura.
Para os chineses, um sorriso pode ser interpretado como um embaraço e
constrangimento. Um olhar fixo nos olhos de outra pessoa é considerado
como um confronto hostil ou invasivo, por isso muitos chineses olham
para o chão durante as saudações. Franzir a testa demonstra
discordância, mas apontar com um dedo e andar com as mãos no bolso é
algo normal para os chineses. Aplauso é comum para expressar que estão
de acordo.
Para os chineses é o anfitrião quem dá início a qualquer conversa, preferencialmente a pessoa mais experiente quando se trata do início e orientação nas conversas. As mulheres devem ser tratadas de acordo com sua posição hierárquica; muitas ocupam cargos de decisão. Durante as aprsentações a iniciativa deve partir do mais importante, indicando seu nome, cargo, título acadêmico, etc. Os chineses apreciam muito os títulos de Diretor, Presidente, Engenheiro, Doutor etc seguidos do sobrenome.
E o que pode parecer invasivo para os ocidentais, para os chineses é normal querer conhecer uma pessoa profundamente, perguntando sobre família, esposa, filhos etc. É cultural: primeiro eles querem conhecer a pessoa em detalhes, só depois fala-se de negócios.
Apesar da China ser um regime comunista, não se deve tratar ninguém por Camarada ou Companheiro, a não ser que pertença ao Partido Comunista e esteja na China. E, para evitar constrangimentos, assuntos sobre governo, partido e qualquer outra referência política do país devem ser evitados.
Na China acredita-se que a paciência é sinônimo de um caráter forte,
valor acrescentado em qualquer ocasião. Mesmo sendo usual a preparação
de uma pauta com antecedência, ninguém vai direto a um assunto antes de
muitos rodeios, formalidades e acenos. É comum cultivar silêncios e
longas pausas enquanto ponderam.
Para os Chineses o silêncio vale ouro, uma oportunidade para refletir
antes de falar e buscar uma resposta mais adequada à situação. Enquanto
o mundo tem pressa, os chineses são astutos e perseverantes prolongando
ao máximo suas negociações e controlando o tempo e o ritmo ao longo das
tratativas.
É extremanente importante não se mostrar impaciente, não se irritar
com demoras e imprecisões, não pressionar, não interromper e não
confundir suas maneiras delicadas como uma resposta positiva. É mais
prudente ser muito observador, paciente e estar disposto a negociar
lentamente, pois as decisões podem levar um longo tempo e exigir
cuidadosas revisões.
Os Chineses não tomam decisões imprudentemente, tudo é bem pensado
para uma posterior resposta. Toda troca de argumentos é assistida com ar
impenetrável. Com um autocontrole super desenvolvido, raramente eles
mudam as suas expressões faciais ou corporais sendo difícil essa
leitura. A maioria dos chineses mantém uma expressão impassível.
Na condução das negociações, em geral os chineses são vagos, sutís e ambíguos em oposição à maioria dos ocidentais habituados a um estilo mais direto, inequívoco e preciso. Há uma grande preocupação em preservar a harmonia, por isso evitam a todo custo usar de objetividade, porque consideram descortesia contradizer ou constranger os outros.
Por considerarem indelicado negar um pedido, polidamente eles sabem
declinar de um pedido dizendo que algo é inconveniente para o momento e
utilizam uma desculpa qualquer. Dificilmente os chineses são taxativos,
nunca dizem "não" diretamente.
Para os Chineses, assinar um contrato significa apenas que
estabeleceu um relacionamento pessoal, o Guanxi. É a partir desse
momento que se começa a tratar dos negócios, quando ambos poderão fazer
solicitações ou ter expectativas de favores. Quando se consegue
estabelecer este relacionamento pessoal, o assunto será tratado somente
entre as duas pessoas. Se houver a interferência de uma terceira pessoa,
as tratativas retornam ao começo.
Esteja sempre preparado para retomar um ponto de partida mantendo-se
flexível para entrar em outros detalhes. Algumas vezes numa reunião a
palavra é dada a um participante que fala muito, podendo parecer que
nada acrescenta à reunião. É melhor ser paciente e escutar ativamente,
pois muitas mensagens sutís podem ser transmitidas.
E sob nenhuma circunstância nunca perca a calma ou use de tom
ríspido, pois isso pode interromper definitivamente ou prejudicar
qualquer negociação. Os argumentos devem ser detalhados e concentrados
em benefícios a longo prazo.
Algo muito interessante são as perguntas que devem ser feitas e
respondidas com cautela. Revelar desconhecimento é uma vergonha. Toda
descortesia deve ser evitada. Os chineses não costumam desligar seus
celulares que tocam constantemente, nunca se deve pedir para que o faça,
pois isso pode ser considerado como intromissão.
Guanxi é uma expressão fundamental da China que designa a complexa
rede de relações indispensáveis ao funcionamento social, político e
organizacional na China, mas há uma demarcação entre os negócios e
socialização sendo necessário cuidado para não entrelaçar os dois: não
se trata e nem se discute negócios durante as refeições e eventos
sociais.
Na China a reciprocidade é fundamental e na mesma medida. Se alguém
oferece algo, deverá ser retribuido com a mesma distinção, nem mais e
nem menos. Se pedir um favor, estará contraindo uma obrigação de
posterior retribuição. Por isso, é necessário saber exatamente o que se
pretende antes de aceitar um favor, um presente ou o convite para um
jantar.
Não é um costume convidar pessoas de suas relações comerciais para um
jantar em casa, geralmente convida-se para ir a um restaurante sendo
inaceitável dividir a conta. Quem convida paga o jantar mas tem a
expectativa de ser convidado para outra ocasião igualmente de forma
gratuita.
Para os chineses o convite para um jantar deve ser repetido três
vezes até ser aceito, a menos que se perceba estar sendo inconveniente.
Se for a um restaurante, ao chegar na entrada nunca se deve passar à
frente do anfitrião, mesmo quando ele dê a passagem. É bom tom recusar
três vezes a passagem e depois fazê-lo, agradecendo.
É um costume aguardar até que lhe seja indicado o seu lugar na mesa.
Em geral um anfitrião chinês senta-se junto da porta para dar ordens e
comandos, mas cede a precedência ao convidado de honra que fica sentado
no topo da mesa de frente para a porta. O anfitrião é o primeiro a comer
e a dar sinal para finalizar e levantar da mesa.
À mesa de refeições, há gestos e atitudes que são comuns na China
além do uso dos Fachis, os pauzinhos que se usa em lugar dos talheres e
que devem respeitar uma série de regras de etiqueta. É considerada
descortesia recusar um chá, sendo preferível aceitá-lo e não bebê-lo. Da
mesma forma, há regras específicas quando se quer presentear ou receber
um presente. A troca de pequenas ofertas faz parte do processo de
Guanxi, mas se não tiver algo para retribuir, não se deve aceitar, pois
isso é considerado uma situação vergonhosa.
Embora os executivos de todo mundo tenham as mesmas perspectivas de crescimento e progresso, cada um sempre agirá de acordo com os costumes de seu país. Porém é importante entender as diferenças de culturas, que pode determinar o fracasso ou sucesso de uma negociação.